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ACESSO: 03.fevereiro.2010; 19:00
TROPICO / EM OBRAS / HOMENAGEM

Parágrafos sobre a Arte Conceitual

Um texto de Sol LeWitt, mestre da arte conceitual, que morreu no último domingo, aos 78 anos.

Sol LeWitt, que morreu no último domingo, aos 78 anos, foi um artista que conseguiu ser compreendido no Brasil no seu justo tempo. Antes mesmo de representar os Estados Unidos na 23ª. Bienal de São Paulo -isto é: quando já estava consagrado-, a invenção de uma "grade" minimalista já provocava um vigoroso debate entre artistas e teóricos, colocando o artista em diapasão com o neoconcretismo. Entre suas mais importantes exposições, cabe lembrar as Documentas 6 e 7 (1977 e 1982) e as participações em curadorias históricas, "Primary Structures" (Jewish Museum, Nova York, 1966) e "When Attitude Becomes Form" (Kunsthalle, Bern, Suíça, 1969).

O texto que a seção “em obras”, de Trópico, reproduz, “Parágrafos sobre a Arte Conceitual”, de 1967, traz a sentença que foi fundamental para Lucy Lippard no seu livro mais canônico, “Six Years: The Dematerialization of the Art Object From 1966 to 1972” (Londres, Studio Vista, 1973): "Nem todas as idéias precisam ser concretizadas". Talvez seja o caso de afirmar que nem todos os críticos, artistas, galeristas e colecionadores compreenderam o alcance desta frase. De todo modo, eis um texto para ler e reler, enquanto Sol Lewitt não está mais entre nós. (Lisette Lagnado)

1. Os artistas conceituais são místicos ao invés de racionalistas. Eles chegam a conclusões que a lógica não pode alcançar.
2. Julgamentos racionais repetem julgamentos racionais.
3. Julgamentos ilógicos levam a novas experiências.
4. A Arte Formal é essencialmente racional.
5. Pensamentos irracionais devem ser seguidos de maneira absoluta e lógica.
6. Se o artista muda de idéia no meio do caminho, enquanto executa seu trabalho, ele compromete o resultado e repete resultados passados.
7. A vontade do artista é secundária ao processo que ele inicia, desde a idéia até sua concretização. Sua voluntariedade pode ser pura manifestação do ego.
8. Quando palavras como pintura e escultura são usadas, elas carregam toda uma tradição e implicam a consequente aceitação desta tradição colocando, assim, limitações ao artista que hesita em ir além dos limites anteriores.
9. Conceito e idéia são coisas diferentes. O primeiro implica uma direção geral enquanto o último são os componentes. As idéias implementam o conceito.
10. Idéias em si podem ser uma obra de arte; estão em uma cadeia de desenvolvimento e podem finalmente encontrar alguma forma. Nem todas as idéias precisam ser concretizadas.
11. As idéias não vêm necessariamente em uma sequência lógica. Podem partir em direções inesperadas, mas uma idéia deve necessariamente estar completa na cabeça antes que a próxima se forme.
12. Para cada obra de arte que se concretiza existem muitas variações não concretizadas.
13. Uma obra de arte pode ser entendida como uma ponte que liga a mente do artista à mente do espectador. Mas pode jamais alcançar o espectador ou jamais sair da mente do artista.
14. As palavras de um artista a outro podem induzir uma cadeia de idéias - se estes compartilham o mesmo conceito.
15. Dado que nenhuma forma é intrinsecamente superior à outra, o artista pode usar, igualmente, qualquer forma, desde uma expressão verbal (escrita ou falada) até a realidade física.
16. Se palavras são usadas e procedem de idéias sobre arte, estas são arte e não literatura; números não são matemática.
17. Todas as idéias são arte se referem à arte e encaixam-se nas convenções da arte.
18. Geralmente entendemos a arte do passado aplicando as convenções do presente e, assim, entendemos mal a arte do passado.
19. As convenções da arte são alteradas por obras de arte.
20. A arte bem sucedida transforma nossa compreensão das convenções ao alterar nossas percepções.
21. Perceber idéias conduz a novas idéias.
22. O artista não é capaz de imaginar sua arte nem de percebê-la antes de estar completa.
23. Um artista pode perceber erroneamente uma oba de arte (entendendo-a diferentemente do autor), mas abandonará sua própria cadeia de pensamento através desta má compreensão.
24. A percepção é subjetiva.
25. O artista não precisa necessariamente entender sua própria arte. Sua percepção não é melhor nem pior que a dos demais.
26. Um artista pode perceber a arte de outrem melhor que a sua própria.
27. O conceito de obra de arte pode envolver o material da peça ou seu processo de realização.
28. Uma vez estabelecida a idéia da obra na mente do artista, e decidida sua forma final, o processo é levado a cabo às cegas. Existem muitos defeitos secundários que o artista não é capaz de imaginar. Estes podem ser utilizados como idéias para novos trabalhos.
29. O processo é algo mecânico e não deve ser outro. Ele deve seguir seu curso.
30. Existem muitos elementos envolvidos numa obra de arte. Os mais importantes são os mais óbvios.
31. Se um artista utilizasse a mesma forma em um grupo de obras, e alternasse o material, poderíamos supor que o conceito envolvia o material.
32. Idéias banais não podem ser redimidas através de uma bela execução.
33. E difícil estragar uma boa idéia.
34. Quando um artista aprende bem demais o seu ofício, ele produz uma arte esperta.
35. Essas frases são comentários sobre arte e não são arte.

Tradução de Silvia Bigi e Márion Strecker Gomes para a revista “Arte em São Paulo”, n. 15, maio de 1983 (Publicado em 9/4/2007)

fernando rios comunicação organizacional - fernando_rios@terra.com.br



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